segunda-feira, 10 de junho de 2013

A previsão orçamentária deve se adaptar à Constituição



O tema foi bastante discutido em audiência pública no STF em 2009 (http://stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=processoAudienciaPublicaSaude). O texto ora respondido (link abaixo) ignora o príncipo da igualdade aristotélica, pelo qual os desiguais devem ser tratados desigualmente. 

Nem sempre um tratamento padrão atende às necessidades de todos os doentes, tratados como gado no texto em questão. Nem todos os diabéticos atingem um controle adequado com as aplicações de insulina, sendo que alguns deles, por serem assintomáticos, não percebem quando a glicemia está caindo ou subindo, e apenas com a bomba de insulina conseguem evitar problemas em seu quotidiano. Ou seja, os efeitos das terapêuticas não são os mesmos. 

O argumento dos custos para o Estado, no caso dos diabéticos, também não se sustenta, pois diabético sem cuidados desenvolve problemas ainda maiores (problemas coronarianos, insuficiência renal, problemas de visão, de articulação, etc) que também deverão ser custeados pelo SUS, e são ainda mais caros. Assim, melhor que os gastos sejam feitos para garantir a qualidade de vida do diabético, e não para retardar os efeitos dos problemas desenvolvidos quando estiver morrendo. 

Parte dos R$ 266 milhões que o Ministério da Saúde gastou em 2011 para o fornecimento de remédios concedidos por liminares equivale aos custos dos processos. Se os remédios fossem concedidos espontaneamente, os custos do SUS seriam reduzidos e a população estaria melhor amparada, o que também aconteceria se a atualização da lista de remédios do protocolo do SUS fosse atualizada com frequência (o que infelizmente não ocorre). 

Não nos esqueçamos que os Estados e Municípios, muitas vezes, incluem como gastos de saúde as reformas em prédios administrativos, ensejando a necessidade da criação de lei para especificar o que seria, de fato, gasto com saúde (Lei Complementar nº 141). 

Vale lembrar ainda que Senadores e Deputados são ressarcidos por todos os seus (e da família) gastos com saúde, inclusive aqueles feitos na rede privada. Um Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo recebeu um adiantamento de R$ 600 mil para cobrir gastos com sua saúde, o que representa mais de dez vezes o tratamento com bomba de insulina anual de dez diabéticos. Então, onde é que está a igualdade tão proclamada pela procuradora? 

O problema não são os pedidos de tratamento dos doentes, mas a ineficiência do SUS. Assim, ouso discordar da procuradora, porque, pelo princípio da proporcionalidade, a saúde do ser humano é prioritária à reserva orçamentária do Estado. Ou a saúde não é direito de todo cidadão e DEVER do Estado (artigo 196 CF)? Portanto, não é a Constituição que deve se adaptar às previsões orçamentárias do Estado, mas o orçamento é que deve se adaptar à ordem constitucional. Esta é a única forma de se tornar efetivo o direito à saúde e à dignidade humana.


Texto publicado como comentários no portal Consultor Jurídico, ao artigo de Hercília Maria Portela Procópio "As decisões extravagantes referentes ao direito à saúde".

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