quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Dilma sanciona sem vetos lei que garante atendimento a vítimas de violência sexual

Brasília – A presidenta Dilma Rousseff sancionou integralmente, sem vetos, a lei que obriga os hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) a prestar atendimento emergencial e multidisciplinar às vítimas de violência sexual. O projeto que deu origem à lei foi aprovado pelo Senado no começo de julho.

O atendimento a vítimas de violência deve incluir o diagnóstico e tratamento de lesões, a realização de exames para detectar doenças sexualmente transmissíveis e gravidez. A lei também determina a preservação do material coletado no exame médico-legal.

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse que a sanção transforma em lei práticas que já eram recomendadas pelo Ministério da Saúde. “Ao ser sancionado, [o projeto] transforma em lei aquilo que já é uma política estabelecida em portaria, que garante o atendimento humanizado, respeitoso a qualquer vitima de estupro. Estou falando de crianças, adolescentes, pessoas com deficiência mental, homens e mulheres, qualquer cidadão brasileiro.”

O governo manteve na lei a previsão de oferecer às vítimas de estupro contraceptivos de emergência – a chamada pílula do dia seguinte –, mas vai encaminhar ao Congresso Nacional um projeto de lei alterando a forma como a prescrição está descrita na lei. De acordo com Padilha, o termo “profilaxia da gravidez” será substituído por "medicação com eficiência precoce para a gravidez decorrente de estupro”, que estava no projeto original. A alteração, segundo o ministro, corrige qualquer interpretação de que a medida poderia estimular abortos na rede pública.

No projeto que será encaminhado ao Congresso, o governo também vai corrigir uma imprecisão sobre o conceito de violência sexual. A nova redação considera violência sexual “todas as formas de estupro, sem prejuízo de outras condutas previstas em legislação específica”. Do jeito que está na lei sancionada hoje, o texto poderia excluir do conceito crianças e pessoas com deficiência mental, que não têm como dar ou não consentimento para atividade sexual.

De acordo com a lei, o paciente vítima de violência sexual deverá receber no hospital o amparo psicológico necessário e o encaminhamento para o órgão de medicina legal e o devido registro de boletim de ocorrência. Os profissionais de saúde que fizerem o atendimento deverão facilitar o registro policial e repassar informações que podem ser úteis para a identificação do agressor e para a comprovação da violência sexual.
 

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Associado de plano de saúde tem direito a tratamento em casa mesmo sem previsão contratual

O ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), garantiu a um associado do plano de saúde da Amil Assistência Médica Internacional Ltda. o direito a tratamento médico, em regime de home care, mesmo sem cobertura específica prevista no contrato.

Segundo o ministro, é abusiva a cláusula contratual que limita os direitos do consumidor, especificamente no que se refere ao tratamento médico. Salomão afirma que o home care não pode ser negado pelo fornecedor de serviços, porque ele nada mais é do que a continuidade do tratamento do paciente em estado grave, em internação domiciliar.

O ministro negou provimento ao agravo interposto pela Amil para que seu recurso especial, contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), fosse admitido pelo STJ e a questão fosse reapreciada na Corte Superior.
 
Segundo o ministro Salomão, não é possível rever os fundamentos que levaram o TJRJ a decidir que o associado deve receber o tratamento de que necessita para a recuperação de sua saúde, embora a operadora tenha incluído no contrato de adesão cláusula restritiva.
 
Fonte: STJ

domingo, 18 de agosto de 2013

Direito e Justiça: antônimos ou sinônimos? Um estudo de caso envolvendo o direito à saúde e o tratamento de diabetes

Há alguns meses, em função de minha participação no Encontro Nacional de Blogueiros e Ativistas em Redes Sociais de Saúde (1), fui convidada pelo Professor Carlos Serra (2) a escrever um artigo para integrar a coleção Cadernos de Ciências Sociais sobre o tema "Direito e Justiça: antônimos ou sinônimos?". Considerando que esta coleção é produzida em Moçambique, e distribuída lá e em outros países (em breve também no Brasil), pensei inicialmente num texto mais teórico, abrangendo o sistema normativo brasileiro, em que a Constituição Federal é hierarquicamente superior a outras leis, prevendo direitos como ordens a serem efetivadas pelos Poderes Públicos (Executivo, Legislativo e Judiciário). Falaria sobre os casos de saúde, objeto principal de meu trabalho como advogada, apenas en passant. Não sabia ainda qual seria a minha conclusão: se Direito e Justiça são antônimos ou sinônimos.

Entretanto, antes de começar a escrever o meu artigo, um de meus processos envolvendo o pedido de insumos de diabetes (bomba de infusão de insulina e seus congêneres) teve um desdobramento bastante inesperado: uma sentença que ignora por completo o direito à saúde previsto no artigo 196 da Constituição Federal, enquanto direito de todo cidadão brasileiro e obrigação do Estado, em função, principalmente, dos bairros onde se localizam o meu escritório e o domicílio da minha cliente. Por considerar que minha cliente dispunha de condições financeiras para custear seu tratamento, o pedido foi rechaçado e minha cliente multada por reivindicar direito a que não faria jus, conforme o entendimento esboçado na sentença, a única improcedente em 5 anos de meu trabalho com pedidos envolvendo o tratamento de diabetes (entre eles, o meu próprio).

Essa decisão (que será rebatida através de recurso de apelação, com sustentação oral perante o Tribunal de Justiça de São Paulo sobre diabetes, bomba de infusão de insulina e práticas antidemocráticas da Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo) me fez pensar sobre Direito e Justiça, e me chamou a atenção para um fator que havia ignorado em minha idéia inicial sobre o artigo: o elemento humano. O ser humano é elemento indissociável da idéia de Justiça, pois o Direito existe para garantir o bem-estar do ser humano. Ainda, a concretização das previsões legais e constitucionais depende da forma como o Direito é "manipulado" (3) por aqueles que trabalham com as leis e com a Constituição Federal. É a partir desse referencial - o elemento humano - que poderemos definir se Direito e Justiça são antônimos ou sinônimos.

Assim, após conversar com o Professor Carlos e a cliente envolvida neste processo judicial, aos quais transmito minha gratidão pela permissão de falar sobre o assunto, o que inicialmente seria uma abordagem teórica sobre o Direito Constitucional Brasileiro, será um estudo de caso relatando a forma como os Poderes Judiciário e Executivo do Estado de São Paulo manejam o direito à saúde.

Para  escrever este artigo, relatarei nesta seção do blog o caso completo (4), desde o pedido administrativo dos insumos à Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo, conforme informações de minha cliente, até seus ulteriores termos. Essas postagens servirão como notas para o artigo que começa hoje a ser escrito. Alguns apontamentos teóricos serão transcritos ao fim de cada post, como forma de guiar a reflexão sobre o caso em análise.

Em tempos de desejo de transparência institucional por que estamos passando no Brasil, como forma de tornar efetivo o Estado Democrático de Direitos, nada melhor do que mostrar como o direito à saúde é tratado por Juízes e administradores da saúde pública. Relatarei aqui o que passam os pacientes que dependem de ordens judiciais para tratar sua saúde adequadamente, e que necessitam de atendimento do Estado para sobreviver. Esclareço que eu sou uma dessas pessoas.


(1) O I Encontro Nacional de Blogueiros e Ativistas da Saúde realizou-se no dia oito de junho de 2013. Cerca de 280 participantes estiveram presentes no encontro realizado no plenário da Câmara Municipal de São Paulo. O evento foi organizado por Priscila Torres.

(2) Carlos Serra é professor do Centro de Estudos Africanos do Departamento de Estudos Históricos e Políticos, da Universidade Eduardo Mondlane, de Maputo/Moçambique; diretor da coleção "Cadernos de Ciências Sociais"; e criador e organizador dos blogs Diário de um sociólogo, Diário de um fotógrafo e Diário de um poeta.

(3) O termo "manipular" empregado reflete seu sentido dúbio que, dependendo do elemento humano que opera o Direito, pode assumir a acepção de "utilizar" ou de "forjar".

(4) As informações sobre as partes deste processo judicial serão trocadas em respeito ao direito à privacidade das pessoas envolvidas.


Reflexões desta postagem (trechos retirados do livro "Verdade e Consenso: Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas. Da possibilidade à necessidade de respostas corretas em Direito", de Lenio Luiz Streck):

- crise de efetividade da Constituição (pág. 1);

- "... passa-se a um direito com potencialidade de transformar a sociedade, como, aliás, consta no texto da Constituição do Brasil, bastando, para tanto, uma simples leitura de alguns dispositivos, em especial, o artigo 3º. O direito, nos quadros do Estado Democrático (e Social) de Direito, é sempre um instrumento de transformação, porque regula a intervenção do Estado na economia, estabelece a obrigação da realização de políticas públicas, além do imenso catálogo de direitos fundametais-sociais" (pág. 2);

-  "... o direito, na era do Estado Democrático de Direito, é um plus normativo em relação às fases anteriores, porque agora é transformador da realidade. E é exatamente por isso que aumenta sensivelmente o polo de tensão em direção da grande invenção contramajoritária: a jursidição constitucional, que, no Estado Democrático de Direito, vai se tranformar na garantidora dos direitos fundamentais-sociais e da própria democracia" (págs. 10/11);

- "Numa palavra: se o direito é um saber prático, a tarefa de qualquer teoria jurídica é buscar as condições para a) a concretização de direitos - afinal, a Constituição (ainda constitui) - e b) ao mesmo tempo evitar decisionismos, arbitrariedades, e discricionariedades (espécies do mesmo gênero, o positvismo) interpretativas." (pág. 12);

- "... ativismo judicial, que, aliás, tem sido praticado às avessas em terrae brasilis, contribuindo para a inefetividade dos direitos fundamentais-sociais. " (pág. 16);

- "... a discussão acerca do constitucionalismo contemporâneo - e de suas implicações políticas - é uma tarefa que (ainda) se impõe. E essa questão assume especial relevância em um país em que as promessas da modernidade, contempladas nos textos constitucionais, carecem de uma maior efetividade." (pág. 21)


#antonimo#

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

CNJ recomenda ao Judiciário a criação de varas especializadas em direito à saúde

Brasília - O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, hoje (6), por unanimidade, recomendação aos tribunais de todo o país para que criem varas especializadas no julgamento de processos relacionados ao acesso à saúde. “A especialização pode propiciar decisões mais adequadas e precisas”, disse a conselheira Maria Cristina Peduzzi, ministra do Tribunal Superior do Trabalho, acompanhando o conselheiro Ney Freitas, relator do processo. Na mesma decisão, o conselho recomendou ao Judiciário prioridade no julgamento de ações que envolvem planos e seguros de saúde.

A recomendação decorre de um pedido de providência encaminhado ao CNJ pelo ex-deputado e atual presidente do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), Flávio Dino, cujo filho morreu em um hospital de Brasília (DF) após sofrer uma crise de asma na escola. Para Dino, houve erro médico no socorro ao filho.

Na petição, Dino pediu ao conselho a edição de uma resolução determinando aos tribunais a especialização de Varas para processar e julgar ações que tenham por objeto o direito à saúde. O argumento principal utilizado no requerimento de Flávio Dino é que o Judiciário tem órgãos especializados em muitos assuntos, como questões trabalhistas, de consumidores, ambientais, violência contra mulher, entre outras, logo deve dedicar a mesma atenção ao maior problema nacional apontado em pesquisas: o mau atendimento, ou negação de atendimento, nas redes pública e privada de saúde.

"É um avanço, apesar de não ser uma resolução, ela aponta para a necessidade de organização do Judiciário para garantir o direito à saúde, que é um direito fundamental”, disse Dino à Agência Brasil. Dino avalia que diante das reclamações e processos cada vez mais frequentes relativas à questão da saúde, é necessária uma maior coerência da organização do Judiciário. "Se é um direito fundamental é preciso que haja um aprimoramento do sistema judicial para atender às demandas da população, com mais rapidez e precisão, pois estamos falando de algo que pode não pode ser perdido", argumentou referindo-se à perda da vida de seu filho.

De acordo com a recomendação, as novas varas para julgar processos envolvendo questões de saúde deverão ser criadas nas varas de Fazenda Pública que agregariam uma nova competência. Outra recomendação aprovada diz que o conhecimento sobre o direito à saúde será cobrado nos concursos públicos para ocupar cargos no Poder Judiciário e também nos cursos de formação dos juízes.

“O cenário normativo envolvido na questão é vasto e exige do magistrado e servidores envolvidos na decisão desse tipo de demanda certa especialização na matéria”, diz parecer do CNJ, anexado à decisão. “A especialização de varas de saúde pública pode garantir maior conhecimento dos magistrados e servidores, decisões mais adequadas e tecnicamente precisas”.

Segundo relatório do CNJ, há 240 mil ações na Justiça relacionadas ao direito à saúde. A maior parte dos processos são referentes a reclamações de pessoas que reivindicam na Justiça acesso a medicamentos e também a procedimentos médicos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), bem como vagas em hospitais públicos e ações diversas movidas por usuários de seguros e planos privados.