Desde abril de 2017, a Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP) vem exigindo a apresentação periódica (a cada 4 meses para insumos e medicamentos, e a cada 6 meses para produtos de nutrição) de receitas médicas para o acesso à assistência farmacêutica do SUS nas unidades de atendimento judicial e administrativo do Estado.
A partir da Nota Técnica CAF no 02, de 31 de janeiro de 2017, a SES-SP vem condicionando o fornecimento de insumos e medicamentos, mesmo os originários de ordens judiciais, à apresentação de receita médica contendo: identificação do Serviço de Saúde com nome, endereço e telefone; nome completo do paciente; Denominação Comum Brasileira (DCB) ou a denominação genérica do medicamento sendo vedado o uso de abreviaturas ou códigos; denominação botânica para medicamentos fitoterápicos; prescrição individual, escrita em caligrafia legível, à tinta ou digitada, sem rasuras e/ou emendas, observadas a nomenclatura e o sistema de pesos e medidas oficiais, indicando a forma farmacêutica, a concentração, a dose, o modo de usar e a duração do tratamento; data de sua emissão, identificação (nome completo e número do registro no conselho de classe correspondente, impresso, carimbo ou de próprio punho) e assinatura do prescritor (item 3 da nota técnica).
Essa é uma medida que vem dificultando o acesso dos usuários aos medicamentos e insumos no Estado de São Paulo, já que nem todos conseguem marcar as consultas dentro dessa periodicidade, sendo que alguns profissionais se recusam a emitir prescrições sem consulta médica. Conforme relatos nos grupos de facebook, na prática a SES vem exigindo até outras condições arbitrárias, sem amparo legal da norma. Uma usuária reclamou da não aceitação de sua receita médica em papel almaço e sem logotipo, mesmo contendo todas as informações requeridas na nota técnica mencionada.
Mas na Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde não há tantas exigências assim. Conforme seu artigo 3º, parágrafo único, inciso VI, as prescrições e receitas médicas devem conter: o nome genérico das substâncias prescritas; clara indicação da dose e do modo de usar; escrita impressa, datilografada ou digitada, ou em caligrafia legível; textos sem códigos ou abreviaturas; o nome legível do profissional e seu número de registro no conselho profissional; e a assinatura do profissional e a data.
Considerando as dificuldades de acesso criadas pela nota técnica da SES-SP, bem como a atualização colaborativa da Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde (saiba mais aqui: http://diabetesedemocracia.blogspot.com.br/2017/05/participe-da-consulta-publica-para.html), que tal aproveitarmos a oportunidade para sugerir um segundo parágrafo ao artigo 3º, dispondo sobre a impossibilidade de estabelecimento de outras condições para além das previstas no inciso VI para condicionar o acesso aos serviços da assistência farmacêutica do SUS?
Com essa previsão na norma federal, a nota técnica regional perde validade. Essa é uma forma de garantirmos nosso direito de acesso aos insumos e medicamentos sem barreiras burocráticas arbitrárias, no Estado de São Paulo e em todo o Brasil!
Vamos lá então redigir nossa contribuição?
Anotação posterior à publicação do post:
Em 22 de maio de 2017 enviei as reflexões desse post à Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo via twitter.
No último dia 21 de agosto, quando estive na Unidade Distribuidora Tenente Pena, recebi um informativo sobre mudanças na validade da receita para insumos e medicamentos: ao invés de 4 meses, agora a receita vale por 6 meses, tempo de espera para consulta na rede pública de saúde, como havia apontado no post, a partir do comentário da endocrinologista e amiga Suzana Vieira.
Resultado interessante, e que mostra como uma argumentação baseada na realidade do SUS pode evitar injustiças, e contribuir para que a racionalidade do acesso não se transforme em racionamento do acesso à assistência farmacêutica.
Também mostra como uma abertura maior da gestão à participação dos profissionais e dos usuários na construção das políticas de saúde poderia conferir maior equidade e eficiência justa (racionalizando sem dificultar o acesso) à atenção em saúde.