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sexta-feira, 20 de março de 2015

O STJ e os 25 anos do Código de Defesa do Consumidor

Um quarto de século. Em 2015, o Brasil comemora os 25 anos da promulgação de seu Código de Defesa do Consumidor, mais conhecido como CDC, com a certeza de que a lei “pegou” e vem sendo rigorosamente aplicada pelo Judiciário nos conflitos entre empresas e clientes.

O consumidor continua sendo o lado frágil da relação comercial, mas agora ele sabe que pode cobrar a qualidade dos produtos e serviços prestados e exigir seus direitos. E se a relação amigável não surtir efeito, ele pode recorrer a um instrumento social e democrático: a Justiça.

Nesse contexto, a importância do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para a consolidação do CDC é inegável. Com suas decisões, o Tribunal da Cidadania mudou o comportamento dos produtores e revendedores, aperfeiçoou os serviços prestados pelas empresas e estimulou a conscientização do consumidor sobre seus direitos e deveres.

Responsável pela uniformização da legislação infraconstitucional, o STJ tem prestigiado o CDC desde a sua entrada em vigor, em março de 1991 (a publicação foi em setembro de 1990). De lá para cá, foram milhares de julgados, várias súmulas e uma ampla jurisprudência consolidada para aperfeiçoar a relação entre consumo e cidadania.

Súmulas

Súmula é um enunciado que resume o entendimento reiterado do tribunal sobre determinada matéria e objetiva facilitar a solução do conflito pela aplicação da jurisprudência já definida nos precedentes. Entre as várias súmulas editadas pelo STJ acerca do CDC – tratando de temas como serviços de proteção ao crédito, telefonia, planos de saúde e muitos outros –, uma cristalizou o reconhecimento do cliente bancário como consumidor de produtos e serviços.

Durante muito tempo, os bancos relutaram em enquadrar seus clientes como consumidores. Um dos primeiros casos foi julgado no STJ em 1995 e envolveu a cobrança de taxa de juros por falta de pagamento. Na época, o Banco do Brasil recorreu ao STJ sustentando que o CDC não podia ser aplicado por se tratar de uma relação banco/cliente, e não banco/consumidor.

O STJ concluiu que o banco “está submetido às disposições do CDC, não por ser fornecedor de um produto, mas porque presta um serviço consumido pelo cliente, que é o consumidor final desse serviço”. Entendeu também que os direitos do cliente “devem ser igualmente protegidos como os de qualquer outro, especialmente porque nas relações bancárias há difusa utilização de contratos de massa, onde, com mais evidência, surge a desigualdade de forças e a vulnerabilidade do usuário” (REsp 57974).

Anos mais tarde, em 2004, o STJ aprovou a Súmula 297, segundo a qual “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. É daquele mesmo ano a Súmula 285, que estabelece para os contratos bancários posteriores ao CDC a incidência da “multa moratória nele prevista”.

Inadimplência e previdência privada

Duas súmulas do STJ tratam da inscrição do consumidor em atraso nos serviços de proteção ao crédito, como o SPC e a Serasa. A Súmula 359 diz que “cabe ao órgão mantenedor do cadastro de proteção ao crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição”, e a Súmula 323 determina que “a inscrição de inadimplente pode ser mantida nos serviços de proteção ao crédito por, no máximo, cinco anos”.

Também no tocante às relações de consumo, a Súmula 321 estabeleceu que “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável à relação jurídica entre a entidade de previdência privada e seus participantes”. Tal qual ocorreu anteriormente com o reconhecimento para os clientes bancários, os participantes de planos de previdência privada devem ser considerados consumidores porque são pessoas que adquirem prestação de serviço como destinatários finais.

Serviços de saúde

Também foi uma súmula do STJ que definiu como abusiva a prática dos planos de saúde de limitar as despesas com internação. Após decisões reiteradas, no ano 2000 o tribunal aprovou a Súmula 302: “É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado.”

A jurisprudência do STJ é no sentido de que a recusa indevida ou injustificada pela operadora de plano de saúde a autorizar a cobertura financeira de tratamento médico a que esteja legal ou contratualmente obrigada enseja reparação a título de dano moral, por agravar a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do beneficiário.

Ainda nessa área, a Súmula 469 determina a aplicação do CDC aos contratos de plano de saúde. Foi assim que o tribunal vedou a discriminação do idoso nos reajustes abusivos das mensalidades dos planos sob alegação de alta sinistralidade do grupo, decorrente da maior concentração de segurados nas faixas etárias mais avançadas. Todavia, essa vedação não atinge os reajustes pela mudança de faixa etária quando os índices não forem excessivos a ponto de impedir a filiação ou a permanência do idoso.

Telefonia e estacionamento

“É legítima a cobrança da tarifa básica pelo uso dos serviços de telefonia fixa.” O enunciado da súmula 356 fixou que a cobrança não constitui abuso proibido pelo CDC, quer sob o ângulo da legalidade, quer por se tratar de serviço que é necessariamente disponibilizado, de modo contínuo e ininterrupto, aos usuários.

Outro enunciado envolvendo a aplicação do CDC é a Súmula 130, que dispõe que “a empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículos ocorridos em seu estacionamento”.

Restituição de valores

Criado pela Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, o CDC trouxe para o ordenamento jurídico a Política Nacional de Relações de Consumo, que tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores; o respeito à sua dignidade, saúde e segurança; a proteção de seus interesses econômicos; a melhoria da sua qualidade de vida; bem como a transparência e harmonia das relações de consumo.

Em 2013, a Segunda Seção do STJ, em julgamento de recurso repetitivo (REsp 1.300.418), firmou o entendimento de que é abusiva a cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos somente ao término da obra ou de forma parcelada, na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por culpa de quaisquer contratantes.

Assim, em tais avenças submetidas às regras do CDC, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.

Para o STJ, a devolução dos valores somente após o término da obra retarda o direito do consumidor à restituição da quantia paga, em violação ao artigo 51, II, do CDC. Constitui ainda vantagem exagerada para o fornecedor, conforme o inciso IV do mesmo artigo.

Também em recurso repetitivo, o tribunal decidiu que a restituição das parcelas pagas por desistente de consórcio deve ocorrer em até 30 dias do prazo previsto em contrato para o encerramento do grupo a que estiver vinculado o participante (REsp 1.119.300).

De avião a futebol

Os consumidores que utilizam transporte aéreo tiveram seus direitos reconhecidos com a aplicação do CDC nos casos de responsabilidade do transportador aéreo por extravio de bagagem e por atraso de voo. Para o STJ, o contrato de transporte consiste em obrigação de resultado, e a falha no serviço caracteriza manifesta prestação inadequada.

No julgamento do REsp 1.280.372, o tribunal concluiu que a postergação da viagem superior a quatro horas constitui falha no serviço de transporte aéreo contratado e gera o direito à devida assistência material e informacional ao consumidor lesado, independentemente da causa do atraso.

O dano moral decorrente de atraso de voo prescinde de prova, e a responsabilidade de seu causador opera-se in re ipsa em virtude do desconforto, da aflição e dos transtornos suportados pelo passageiro. O mesmo vale para o caso de extravio de bagagem (AREsp 582.541).

Recentemente, a Terceira Turma do STJ aplicou o CDC para condenar um clube de futebol e a Federação Paulista ao pagamento de indenização por danos materiais e morais a um torcedor que sofreu lesões ao cair de uma das rampas de acesso ao estádio do Morumbi.

O colegiado concluiu que a responsabilidade das entidades organizadoras, dos clubes e de seus dirigentes pelos danos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios é objetiva e solidária, em face da incidência dos artigos 14, parágrafo 1º, e 7º do CDC (REsp 1.513.245).

Além da punição dos que praticam atos ilícitos nas relações de consumo, o CDC esclarece os fabricantes, fornecedores e prestadores de serviços sobre suas obrigações, contribuindo para uma atitude empresarial de maior respeito ao consumidor, o que acaba por ampliar e fortalecer sua presença no mercado.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça (STJ)

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